Olá, leitores!
Há um certo tempo que eu gostaria de fazer uma postagem sobre este assunto aqui no blog, e hoje, aqui está ela (ou parte dela) ! Neste post introduzo a você a nova série do blog Cultura Sobre a Mesa, relativa ao Guia Alimentar para a População Brasileira!
Você conhece o Guia, os seus objetivos, ou o porquê dele ter sido elaborado? E mais, conhece os benefícios que ele pode trazer para a sua saúde e a de sua família através da educação alimentar?
Nesta série, vamos esclarecer juntos essas e outras dúvidas, e destrinchar um pouco mais o Guia Alimentar ! E para começar, baixe a nova versão do Guia Alimentar clicando aqui .
Segurança Alimentar e Nutricional
O Guia Alimentar foi elaborado e
publicado pela primeira vez no ano de 2006. Trata-se de um documento elaborado
pelo Ministério da Saúde com o objetivo de apresentar diretrizes alimentares
oficiais à população brasileira dentro do contexto atual do país. No início do
Guia, é apresentado o seguinte objetivo:
"Tendo por pressupostos os direitos à saúde e à alimentação adequada e saudável, o guia é um documento oficial que aborda os princípios e as recomendações de uma alimentação adequada e saudável para a população brasileira, configurando-se como instrumento de apoio às ações de educação alimentar e nutricional no SUS e também em outros setores. Considerando os múltiplos determinantes das práticas alimentares e, a complexidade e os desafios que envolvem a conformação dos sistemas alimentares atuais, o guia alimentar reforça o compromisso do Ministério da Saúde de contribuir para o desenvolvimento de estratégias para a promoção e a realização do direito humano à alimentação adequada" (BRASIL, 2014).
Indiscutivelmente, pode-se dizer que
muita coisa mudou de 2006 até 2015 no que diz respeito, também, à situação
alimentar brasileira. Todas as mudanças sociais e econômicas influenciam
diretamente a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) do país, logo há
necessidade de apresentar novas recomendações para que este direito seja
garantido, e este documento é uma contribuição de grande relevância na
construção e melhoria da SAN de nosso país.
Que tal já compartilhar essa postagem
com seus amigos para que eles também conheçam e possam acessar o Guia?
Começo a explicação do Guia Alimentar apresentando a definição de SAN.
A Lei Orgânica de Segurança Alimentar e
Nutricional (LOSAN) , lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006, cria
o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com o
objetivo de assegurar o direito humano à alimentação adequada, establecendo princípios,
diretrizes e composição do SISAN, conciliando a participação do poder público
com a sociedade, instituições e organizações formulando e implementando
políticas e outras ações para assegurar o direito humano básico à alimentação
(BRASIL, 2006).
Esta Lei não possui um conceito
limitado sobre o que é SAN, mas sim apresenta uma definição composta por um
conjunto de fatores abrangidos pela SAN, considerando aspectos culturais e de
soberania do país. Esta Lei pode ser consultada clicando aqui , e o trecho
apresentado abaixo em itálico foi retirado integralmente da LOSAN (BRASIL,
2006), a qual deve abranger:
" I – a ampliação das condições de
acesso aos alimentos por meio da produção, em especial da agricultura
tradicional e familiar, do processamento, da industrialização, da
comercialização, incluindo-se os acordos internacionais, do abastecimento e da
distribuição dos alimentos, incluindo-se a água, bem como da geração de emprego
e da redistribuição da renda;
II – a conservação da biodiversidade e
a utilização sustentável dos recursos;
III – a promoção da saúde, da nutrição
e da alimentação da população, incluindo-se grupos populacionais
específicos e populações em situação de vulnerabilidade social;
IV – a garantia da qualidade biológica,
sanitária, nutricional e tecnológica dos alimentos, bem como seu
aproveitamento, estimulando práticas alimentares e estilos de vida saudáveis
que respeitem a diversidade étnica e racial e cultural da população;
V – a produção de conhecimento e o
acesso à informação; e
VI – a implementação de políticas
públicas e estratégias sustentáveis e participativas de produção,
comercialização e consumo de alimentos, respeitando-se as múltiplas
características culturais do País " (BRASIL, 2014) .
Como podemos ver, a definição de SAN
vai muito além da garantia ao acesso permanente, e em quantidades adequadas, de
alimentos seguros, sem o comprometimento das demais necessidades básicas do
indivíduo. No primeiro tópico, vemos que SAN está relacionada à ampliação das
condições de acesso a alimentos através de diferentes estratégias, com foco na
agricultura tradicional e familiar, a qual é responsável pela maior parte dos
alimentos produzidos e consumidos no país. Em 2011, a agricultura familiar era
responsável por mais de 70% dos alimentos produzidos no Brasil, mas esse
sistema ainda sofre com relação à comercialização e organização da produção, além
da menor capacidade competitiva quando comparadas a grandes empresas e/ou
multinacionais. Ainda há deficiências na unificação desse sistema para
regulamentar a comercialização dos produtos agropecuários em todo o país, mas o
estímulo à agricultura familiar, principalmente por redes de supermercados, por
exemplo, e ainda de instrumentos públicos (a exemplo dos Bancos de Alimentos e
Restaurantes Populares) , pode ajudar os
produtores a conquistar uma parcela maior do mercado e estimular o aumento de
sua produção e competitividade por meio da venda direta dos produtos ao
consumidor, sem distribuidores ou atravessadores.
A SAN deve abranger
a conservação da biodiversidade com a utilização sustentável dos recursos
naturais, para que a satisfação das necessidades da população atual sejam
satisfeitas mas que isso não comprometa a satisfação das necessidades das
gerações futuras. Os recursos (alimentares, hídricos, energéticos, entre
outros) podem e devem ser utilizados pelo homem para a satisfação das necessidades,
no entanto, devem ser explorados de maneira consciente e responsável,
respeitando-se o tempo de renovação de determinados recursos, e em conjunto com
o conhecimento científico e técnico para o desenvolvimento e utilização de
tecnologias que contribuam no progresso sustentável do nosso país e do
mundo.
"Art. 2o A alimentação adequada é direito fundamental do ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição Federal, devendo o poder público adotar as políticas e ações que se façam necessárias para promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população" (BRASIL, 2006)
Como a alimentação
trata-se de um direito humano básico, a SAN ainda deve promover a saúde, a
nutrição e a alimentação da população incluindo os grupos populacionais em
situações de risco ou vulnerabilidade social. Infelizmente, ainda vemos no
Brasil e no mundo muitas situações de vulnerabilidade social, em que os
direitos humanos básicos ainda não foram totalmente ou dignamente atingidos. No
entanto, acredita-se que, com relação a alimentação, ações individuais e
coletivas da população podem contribuir significativamente na possível
amenização desta situação, através, por exemplo, do não desperdício de alimentos
e do aproveitamento integral destes (este ainda pode ser um futuro tema de
postagem aqui no blog, o que acham?) . As estatísticas relacionadas ao
desperdício de alimentos são assustadoras, e acredito que mais do que aumentar
a produção de alimentos é necessário reduzir o desperdício. Nosso país tem um
grande potencial para o cultivo de diversos gêneros alimentícios, no entanto,
também é expressiva a quantidade de alimentos que vão para o lixo diariamente
por diversas razões (perdas durante o transporte, má manipulação, mau controle
das condições de armazenamento, e mesmo perdas significativas durante o preparo
destes alimentos para o consumo), e isso contribui no agravamento da situação
de insegurança alimentar que ainda pode ser observada em algumas regiões do
país.
Garantir a qualidade
biológica, sanitária, nutricional e tecnológica dos alimentos e produtos
alimentícios também é de fundamental importância, pois a garantia do acesso à
alimentação adequada deve ser completa. O estímulo a práticas alimentares e
estilos e vida saudáveis respeitando as peculiaridades e a diversidade étnica,
racial e cultural brasileira também é de igual importância, e o novo Guia
Alimentar para a População Brasileira traz conteúdos que justamente atendem a
esse tópico dentro da SAN, pois cada povo e cada comunidade possuem tradições
alimentares diferentes e que precisam ser respeitadas, a cultura sobre a
mesa e a diversidade devem ser valorizadas e aliadas a hábitos de vida
saudáveis, conciliando assim bem-estar nutricional e cultural.
A produção de conhecimento e o acesso à
informação também são fundamentais para a garantia desse direito, e o Guia
Alimentar vem mais uma vez ao encontro do que está contemplado na definição de
SAN. Leva conteúdos de grande importância para a população brasileira, de
maneira clara e com uma linguagem acessível, contribuindo no despertar da
conscientização sobre a importância e impacto da educação alimentar na
qualidade de vida individual e coletiva. Além disso, é de extrema importância e
necessidade a implementação de políticas públicas e estratégias sustentáveis de
produção, comercialização e consumo de alimentos e produtos alimentícios com
respeito à diversidade cultural do país. Isto é, deve-se estimular a criação e
incorporação de hábitos alimentares e estilo de vida saudáveis, mas sem deixar
de lado as tradições e peculiaridades alimentares das diferentes culturas que
formam o povo brasileiro.
Muito se lê e se vê nos veículos de
comunicação e nas redes sociais sobre restrições alimentares, e o
sensacionalismo é tanto que acaba sendo criada uma situação de neuroticidade
alimentar na sociedade... Confesso que muitas notícias, postagens
e depoimentos que vejo atualmente me geram certa revolta e indignação, porque
muitas vezes estes veículos de informação, que deveriam ser utilizados para
esclarecimentos, compartilhar conhecimento, estimular o pensamento e a capacidade
crítica das pessoas, acabam sendo utilizados como meio de propagação de
inverdades e afirmações categóricas sobre isto ser "bom" e aquilo ser
"ruim", sem a preocupação de embasar os argumentos utilizados com
estudos científicos de boa qualidade. Na maioria da vezes, essas
restrições alimentares propagadas por famosos e anônimos se chocam com a
abrangência da SAN à medida que muitas vezes as tradições e a cultura alimentar
do brasileiro acabam sendo desrespeitadas e desvalorizadas pela disseminação da
ideia de que o alimento "x" é "muito calórico", ou
"tem muitos carboidratos", entre outros "argumentos" ainda
muito relativos e discutíveis.
Os artigos 5º e 6º da LOSAN ainda
ressaltam que a consecução do direito humano à alimentação e à SAN devem respeitar
a soberania dos países, conferindo primazia às decisões por eles tomadas com
relação à produção e consumo de alimentos; e que ainda o Estado brasileiro deve
empenhar-se juntamente com países estrangeiros para que a realização desse
direito básico possa ser executada e adequada no plano internacional.
O Guia Alimentar
Começando a explorar...
O Sumário apresenta todo o conteúdo que é abordado no Guia, lançado em
novembro de 2014, e que possui 145 páginas. Como você pode perceber, é um
volume bastante grande de informação, mas não se assuste com o número de
páginas. Como disse anteriormente, essa nova versão do Guia possui uma
linguagem muito acessível, tanto para instituições e organizações, como para a
sociedade de maneira geral. Foi elaborado por profissionais da área da
saúde, educadores, representantes de organizações da sociedade civil brasileira,
e ainda recebeu contribuições durante o período de consulta pública em que
envolveu 436 participantes e recebeu mais de 3000 comentários e
sugestões. Portanto, trata-se de uma ferramenta de formação, orientação e
inspiração para a sociedade e profissionais, com vistas a promover a saúde e a
alimentação saudável, auxiliando dessa forma na prevenção de doenças e
amenização do quadro de desnutrição que o Brasil enfrenta atualmente.
E quando digo desnutrição não digo necessariamente subnutrição, ou falta
de acesso a alimentação/alimentação escassa, estou falando também de sobrepeso
e obesidade. Pessoas nessas condições também podem apresentar carência de
diversos nutrientes, apresentando quadros de desnutrição. O Brasil tem
apresentado nas últimas décadas um aumento intenso e contínuo da obesidade,
processo que podemos chamar de transição epidemiológica, em que, de
uma maneira resumida, as doenças infecciosas passaram a ser controladas de
certa forma ao passo que as doenças crônicas não transmissíveis (hipertensão,
doenças cardiovasculares, diabetes, entre outras) fugiram do controle e têm
vitimado cada vez mais pessoas em nosso país, justamente pela modificação dos
padrões alimentares e estilo de vida. O consumo exagerado de alimentos ultra
processados aliado ao sedentarismo e a hábitos de vida não saudáveis (consumo
de bebidas alcoólicas, tabagismo, entre outros) contribuíram certamente para
este processo e para a situação alimentar atual. Além destes fatores, mudanças
políticas, sociais, econômicas e culturais também contribuíram para este
quadro.
Veja neste infográfico o comportamento da obesidade no Brasil, e a comparação da obesidade nos Brics.
Imagem retirada de: |
A OMS (Organização Mundial da Saúde) coloca a obesidade como um dos maiores problemas de saúde pública do mundo, estimando que o número de pessoas adultas obesas no mundo em 2025 seja superior a 700 milhões, além de 2,3 bilhões com sobrepeso. Para crianças com sobrepeso e obesidade ao redor do mundo, estima-se uma valor de 75 milhões! As projeções realmente são bastante assustadoras, pois este problema pode desencadear diversas doenças graves que podem inclusive levar milhares de pessoas a óbito. No Brasil, aponta-se que mais de 50% da população está com sobrepeso! Confira neste link como está o mapa da obesidade no Brasil por regiões. Veja só, por exemplo, como está a obesidade na região Sul do país:
Mapa da obesidade no Brasil. Imagem retirada de: http://www.abeso.org.br |
Isso posto, vemos mais uma vez a importância deste Guia como ferramenta essencial no enfrentamento deste cenário ainda na apresentação do documento:
"Para o enfrentamento desse cenário, é emergente a necessidade da ampliação de ações intersetoriais que repercutam positivamente sobre os diversos determinantes da saúde e nutrição. Nesse contexto, o setor saúde tem importante papel na promoção da alimentação adequada e saudável, compromisso expresso na Política Nacional de Alimentação e Nutrição e na Política Nacional de Promoção da Saúde. A promoção da alimentação adequada e saudável no Sistema Único de Saúde (SUS) deve fundamentar-se nas dimensões de incentivo, apoio 6 MINISTÉRIO DA SAÚDE e proteção da saúde e deve combinar iniciativas focadas em políticas públicas saudáveis, na criação de ambientes saudáveis, no desenvolvimento de habilidades pessoais e na reorientação dos serviços de saúde na perspectiva da promoção da saúde" (BRASIL, 2014) .
O Guia se introduz como "um
conjunto de informações e recomendações sobre alimentação
que objetivam promover a saúde de pessoas, famílias e
comunidades e da sociedade brasileira como um todo, hoje e
no futuro" (BRASIL, 2014) , o qual substitui a versão de 2006. O Guia pode ser consultado e utilizado diariamente tanto por profissionais da saúde como em nossa casa. Na introdução, traz um resumo do conteúdo de cada capítulo, é bem interessante que antes de você consultar as recomendações leia os conteúdos iniciais (apresentação, preâmbulo e introdução), pois estes tópicos nortearão você por dentro do próprio Guia e apresentarão com mais detalhes o objetivo desse material.
Vamos combinar assim, então? Você lê o conteúdo introdutório do Guia Alimentar e na próxima postagem desta série, partiremos para o Capítulo 1 ! Vem muita informação por aí, não deixe de acompanhar e de participar, comentando, enviando dúvidas, sugestões, e compartilhando a postagem com seus amigos!
Gratidão!
--
Referências bibliográficas e referências consultadas:
ABESO. Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica . Mapa da Obesidade. Disponível em:<http://www.abeso.org.br/atitude-saudavel/mapa-obesidade>. Acesso em 19 set. 2015.
BLOG DA SAÚDE. Ministério da Saúde. Ministério da Saúde lança Guia Alimentar para a População Brasileira. Disponível em:<http://www.blog.saude.gov.br/570-perguntas-e-respostas/34678-ministerio-da-saude-lanca-guia-alimentar-para-a-populacao-brasileira>. Acesso em 17 set. 2015.
BRASIL. Lei 11.346, 15 de setembro de 2006. Lei Orgânica de Segurança
Alimentar e Nutricional. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11346.htm>. Acesso em 17 set. 2015.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Guia Alimentar para a População Brasileira. 2 ed., Brasília : Ministério da Saúde, 2014. 156 p. Disponível em: <http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira.pdf>. Acesso em 19 set. 2015.
COMISSÃO DE OBESIDADE. Prevenção e Combate no Brasil. Disponível em:<http://www.obesidadenobrasil.com.br/>. Acesso em 19 set. 2015.
INSTITUTO HUMANITAS UNISINOS. Novo Guia Alimentar Brasileiro é direcionado à população. Entrevista especial com Maria Laura Louzada. 2014. Disponível em:<http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/537461-novo-guia-alimentar-brasileiro-e-direcionado-a-populacao-entrevista-especial-com-maria-laura-louzada>. Acesso em 19 set 2015.
PORTAL BRASIL. Agricultura familiar produz 70% de alimentos do País mas ainda sofre na comercialização. 2011. Disponível em:<http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2011/07/agricultura-familiar-precisa-aumentar-vendas-e-se-organizar-melhor-diz-secretario>. Acesso em 16 set. 2015.
G1. Excesso de peso atinge 52,5% dos brasileiros, segundo pesquisa Vigitel .2015. Disponível em:<http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2015/04/excesso-de-peso-atinge-525-dos-brasileiros-segundo-pesquisa-vigitel.html>. Acesso em 19 set. 2015.
Nenhum comentário:
Postar um comentário