quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Que fruta é essa?


Adorado por uns, rejeitado por outros, este fruto é muito rico nutricionalmente e mais versátil do que se imagina... Você gosta de tamarindo



Deixe seu comentário ao final da leitura do post de hoje, que trata sobre esse fruto pertencente ao conjunto de Plantas Alimentícias Não-Convencionais do Brasil. Boa leitura!



Tamarindo vem do árabe "Tamr hindi", traduzido ao português como Tâmara da Índia  


Vamos começar com um retrato da nossa estrela de hoje. Com vocês, os tamarindos!



Frutos de tamarindo. Fonte da imagem: autoria própria.

   Acredito que muitas pessoas, assim como eu, não conhecia o tamarindo ao vivo e a cores, embora já tivesse ouvido falar ou até mesmo experimentado algum prato que levasse este fruto tropical. Mas a partir de hoje, conheceremos um pouco sua origem, propriedades nutricionais e seus diversos usos culinários e medicinais.

   Comecemos por suas características básicas. Tamarindus indica L. é o nome científico do fruto que conhecemos popularmente como tamarindo, tamarinho, tamarino, jibaí ou tâmara-da-índia. Da família Fabaceae, o tamarindeiro é nativo da África tropical e da Índia, regiões em que tem grande importância alimentar, mas também pode ser encontrada em mais de 50 países, como México, Costa Rica e, claro, Brasil. A copa dessa árvore é bastante frondosa e baixa, sendo as flores pequenas e amarelas, e os frutos marrons do tipo legume indeiscente. Sim, os frutos do tamarindo são legumes! Este termo é comumente utilizado para vegetais consumidos após cocção (como berinjela, abobrinha e outras hortaliças), mas de acordo com a Botânica, legumes são os vegetais cujos frutos estão geralmente dispostos em bagas. São os frutos das leguminosas, sendo alguns exemplos o feijão, a vagem, a ervilha e a soja. Aliás, 2016 é considerado pela Organização para a Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO/ONU) o ano das leguminosas, assunto sobre o qual falarei em um post especial aqui no blog.
   

Nada se perde


   Os maiores produtores de tamarindo são a Índia e a Tailândia (CALUWÉ; HALAMOVÁ; VAN DAMME, 2010), e embora seja um fruto exótico, o tamarindo tem grande importância e participação na cultura alimentar brasileira, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, onde é bastante consumido. 
   O tamarindo é um fruto muito versátil e pode ser quase que totalmente aproveitado. A polpa, avermelhada e fibrosa, é ao mesmo tempo doce e azeda, o que agrada muito ou desagrada aqueles que a experimentam.
   De todo modo, quando consumimos a polpa sentimos um sabor diferenciado, que mistura os gostos doce e azedo (este devido a uma série de ácidos presentes, dentre eles os ácidos tartárico, málico e cítrico), o que a torna um bom ingrediente para ser utilizado como tempero em molhos, caldos e outras preparações. A polpa pode ser consumida fresca, sob a forma de sucos, e ainda dá origem a geleias, compotas ou utilizada na preparação de outros alimentos. Balas, xaropes e caldas reforçam ainda mais a versatilidade do tamarindo enquanto alimento e ingrediente.



Aqui é possível ver as partes do fruto: casca, polpa e sementes, as quais também
são utilizadas na confecção de alguns artesanatos.
Imagem retirada de ibflorestas.org.br



   Outras partes do tamarindo e do tamarindeiro podem ser consumidas. O livro Plantas Alimentícias Não-Convencionais (PANC) no Brasil, de Valdeli Kinupp e Harri Lorenzi, traz informações bem interessantes sobre este e outros frutos e plantas, indicando as partes próprias para consumo e sugestões de preparos culinários. Neste livro, encontramos que os frutos ainda imaturos com casca e sementes também podem ser consumidos em sopas, temperos e molhos. As sementes do tamarindo podem ser torradas e moídas de forma a obter um pó com o qual prepara-se uma bebida, similar ao café. Das sementes ainda é possível extrair óleo, pectina (um espessante natural) e amido, e até a casca pode ser mascada. As flores e os brotos das sementes germinadas são boas opções para compor saladas. E até as folhas e folíolos do tamarindeiro podem ser apreciados.

  De acordo com a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (TACO, 2011), uma porção de 100 g de tamarindo cru possui 276 kcal, 72,5g de carboidratos, 59 mg de Magnésio (nutriente importante em muitas reações químicas do nosso metabolismo) e 723 mg de potássio (de grande importância para a síntese de proteínas, do glicogênio, na contração muscular e transmissão dos impulsos nervosos). Além de ser rico em açúcares, ainda que seu sabor pareça dizer o contrário, o tamarindo também é rico em vitaminas do complexo B e possui atividade antioxidante (que, de maneira simplificada, é uma capacidade de eliminar os radicais livres do organismo) . A polpa ainda possui uma série de aminoácidos importantes, como Ácido Aspártico, Arginina e Triptofano, minerais como Selênio, Fósforo e Cálcio, além de pequenas quantidades de ácido linoléico (ômega 6) e ácido alfa-linolênico (ômega 3).
 

Propriedades bioativas e usos medicinais


   Estudos sobre o potencial bioativo do tamarindo retornam resultados bem positivos e interessantes quando pensamos na reutilização de coprodutos do processamento industrial (gerados pela indústria de conservas, por exemplo). Sudjaroen et al. (2005) estudaram os compostos fenólicos (compostos com ação antioxidante) das sementes e do pericarpo do tamarindo, frações geralmente descartadas do processamento, e concluíram que esses coprodutos podem constituir fontes seguras, naturais e de baixo custo de substâncias com efeito quimiopreventivo (relacionado à inibição ou supressão das fases iniciais da carcinogênese). Outros autores fizeram uma ótima revisão bibliográfica sobre o tamarindo, e apresentam diversos estudos que ressaltam a versatilidade deste fruto, as propriedades de suas partes (composição química, perfil de minerais e aminoácidos, entre outros aspectos) e o valoriza como potencial fonte de substâncias bioativas (CALUWÉ; HALAMOVÁ; VAN DAMME, 2010).
   
   Além das sementes e da casca, o pericarpo do tamarindo, as folhas e as flores do tamarindeiro também possuem atividade antioxidante, o que pode ser devido aos compostos fenólicos presentes nessas partes da planta. Um estudo realizado por Martinello et al. (2006) apontou que hamsters com hipercolesterolemia (altas concentrações de colesterol no sangue) que consumiram o extrato da polpa do tamarindo obtiveram um decréscimo nos níveis séricos de colesterol total e do LDL (colesterol "ruim"), e um aumento nos níveis de HDL (colesterol "bom"), o que sugere a possibilidade de redução dos riscos de desenvolvimento de aterosclerose em humanos. O fruto ainda possui atividade anti-inflamatória, e propriedades anti-fúngica e anti-bacteriana (CALUWÉ; HALAMOVÁ; VAN DAMME, 2010). Os resultados dos estudos das propriedades bioativas do tamarindo são bastante interessantes, e constituem um bom campo de pesquisa e trabalho para elucidar questões ainda pouco exploradas. 
   

As lindas flores do tamarindeiro são comestíveis e podem enfeitar
diversos pratos. Imagem retirada de: aunatura-land.com
   
   O tamarindo ainda é utilizado para fins medicinais em países como Índia, Sudão e Bangladesh, devido a sua alta disponibilidade e facilidade de obtenção. O fruto possui ação expectorante e é bastante utilizado para melhora da digestão e possui efeito carminativo (antiflatulento), podendo ser consumido sozinho ou em combinação a outros alimentos, como suco de limão ou mel. Essa ação laxativa é devida a presença de altos teores dos ácidos málico e tartárico. Extratos das raízes também são usados em países africanos para combater dores de estômago ou abdominais decorrentes de constipação.  Também possui ação expectorante, sendo utilizado em gargarejos para combater a dor de garganta. As folhas e/ou as cascas do tamarindo ainda podem ser utilizadas na cicatrização de ferimentos. Há ainda muitas outras propriedades medicinais estudadas, como apresentado por Bhadoriya et al. (2011). 


Hora das receitas



   Como visto, o tamarindo pode ter mil e uma utilidades, além de diversas maneiras de ser preparado para consumo. Aqui deixo duas receitas de pratos tradicionais à base de tamarindo. Você pode fazer e me contar o que achou, além de liberar sua criatividade e criar novas receitas. 



1) Bolas de tamarindo 

Por Neide Rigo

Ingredientes: 
300g de tamarindo (vagens frescas ou em bloco)
1/2 xícara de açúcar
1/4 de xícara de água
1 colher (café) de sal
2 colheres (sopa) de pimenta vermelha seca em flocos*
Para passar as bolinhas:
2 colheres (sopa) de açúcar
1 colher (sopa) de pimenta vermelha seca, em flocos
1 colher (café) de sal
Modo de preparo: 
Descasque os tamarindos (se estiver usando as vagens). Basta apertar levemente e ir tirando os pedaços de casca e as fibras que recobrem a polpa. Coloque o açúcar, a água, o sal e a pimenta numa panela pequena. Misture bem e leve ao fogo baixo. Quando ferver, junte o tamarindo e cozinhe por 10 a 15 minutos, até que o líquido evapore e reste uma pasta espessa que se desprende do fundo da panela. Retire do fogo e deixe esfriar. Tire e descarte uma parte das sementes; deixe algumas para dar estrutura às bolinhas. O melhor é deixar a pasta de um dia para outro na geladeira, antes de modelar as bolinhas. Ponha o açúcar, a pimenta e o sal em um prato e misture, para cobrir as bolinhas.  Tire porções da massa do tamanho de bolinhas de gude e enrole-as nas mãos, com ao menos uma semente em cada. Passe pela mistura e sirva. Rende cerca de 50 bolinhas
*Use pimenta em flocos daquelas para kimchi, mais suaves, ou outra sem sementes, para não ficar muito picante. Se quiser guardar o doce, envolva em papel-celofane. Só não se esqueça de tirar as sementes da boca ao comer.


Bolinhas de polpa de tamarindo cobertas com açúcar é uma das formas de consumir o fruto, comum principalmente no México, podendo ainda ser adicionadas de sal e pimenta.
Imagem retirada de: mamitasdelights.com

2)  Geleia de Tamarindo


Retirada do livro Plantas Alimentícias Não-Convencionais (PANC) no Brasil, de Valdeli Kinupp e Harri Lorenzi

Colha frutos maduros e deixe-os de molho em água morna para facilitar o descascamento e a remoção da polpa. Ou utilize polpa congelada disponível em alguns mercados. Para 1 kg de polpa fresca ou congelada, utilize 500 g de açúcar cristal. Mexa em fogo baixo até o ponto desejado. 
Fica uma geleia cremosa e agridoce deliciosa. A polpa pode ser diluída e usada para calda e condimento de pratos diversos.




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Gratidão!




Referências consultadas:
 

BHADORIYA, S.S.; GANESHPURKAR, A.; NARWARIA, J.; RAI, G.; JAIN, A.P. Tamarindus indica: Extent of explored potential. Pharmacogn Rev, v. 5, n.9, p.73-81, 2011. Disponível em:<https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3210002/>.

CALUWÉ, E.D.; HALAMOVÁ, K.; VAN DAMME, P. Tamarindus indica L. – A review of traditional uses, phytochemistry and pharmacology. Afrika Focus, v. 23, n. 1, p. 53-83, 2010. Disponível em:<https://biblio.ugent.be/publication/990834/file/1017918>. Acesso em 20 set. 2016.

KINUPP, V.F.; LORENZI, H.  Plantas Alimentícias Não-Convencionais (PANC) no Brasil: guia de identificação, aspectos nutricionais e receitas ilustradas. São Paulo: Instituto Plantarum de Estudos da Flora, 2014, p. 400-401.

RIGO, N. Doce? Azedo? Tamarindo é os dois. Disponível em:<http://www.estadao.com.br/noticias/geral,doce-azedo-tamarindo-e-os-dois-imp-,1052289>. Acesso em 23 set. 2016. 


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