terça-feira, 15 de novembro de 2016

Arde, mas não queima...

Hoje o post está bem caliente!

  Tem quem adore, tem que não suporte... tem quem coma bastante, tem quem seja muito sensível a pequenas quantidades.


  Hoje vamos conhecer mais sobre pimentas! Eu particularmente gosto bastante de pimentas, aliás elas sem as sementes e fritas são uma delícia. Costumo consumir as menos ardidas (na minha opinião), como a dedo-de-moça, a tabasco e a biquinho. Mas você sabe por que as pimentas provocam ardência, e qual é a pimenta mais forte do mundo ??

  Se você gosta de pimentas, curta e compartilhe esse post com seus amigos. E se não gosta, compartilhe também, pois esses alimentos são fascinantes e estão muito presentes na culinária brasileira - e, com certeza, você conhece alguém que seja louco por pimenta.


Pimentas dedo-de-moça. Fotografia de autoria própria.



Encantadores de pimentas 


  O termo "pimenta" utilizado no Brasil faz referência a 3 espécies: às do gênero Capsicum L., às do gênero Piper e às do gênero Pimenta. Dentro desses 3 gêneros existem diversas espécies, que apresentam uma variedade de cores, tamanhos, formatos e picância/ardência. 
  As espécies do gênero Capsicum, originário do continente americano, compreendem as pimentas e os pimentões (também chamados de "pimentas-doces" por não apresentarem aquela ardência característica quando consumidos). Dentre as mais de 150 variedades de pimenta deste gênero já catalogadas, somente 5 são domesticadas, a saber: Capsicum annum, C. baccatum, C. chinense, C. frutescens e C. pubescens, a qual não é cultivada no Brasil. Ainda existem cerca de 40 espécies silvestres e ainda muitas outras variedades não descobertas, principalmente na região da Mata Atlântica. É um verdadeiro mundo esse das pimentas!
  Já as espécies do gênero Piper são as mais antigas do mundo, do qual faz parte a famosa pimenta-do-reino (ou pimenta-da-Índia), que chegou ao Brasil pelos portugueses na época do descobrimento. Essa pimenta dominava o mercado de especiarias na época, e era muito desejada por ter um bom efeito como conservante de alimentos como carnes. Ela tem tanta importância que inclusive gerou uma expressão que utilizamos até hoje: "pagar em espécie". Isso ocorreu porque a pimenta-do-reino também era utilizada como moeda de troca nesse mercado de especiarias, legal, né?
  Os povos africanos também trouxeram consigo novas espécies de pimentas, e só fizeram enriquecer a nossa culinária com o uso das pimentas e de outros temperos. Mas aqui no Brasil os indígenas já cultivavam e utilizavam a pimenta no preparo de alimentos, o que é feito até hoje. 



  Os indígenas da tribo baniwa vivem na aldeia Tunuí Cachoeira, norte da Amazônia, e são verdadeiros mestres no cultivo de pimentas. Na aldeia dos baniwa vivem hoje cerca de 300 pessoas, e a mitologia da tribo conta que um ser primordial chamado "inhapculiqueu" usou a pimenta como um instrumento de proteção ao próprio corpo e também no preparo dos alimentos, como conta o índio baniwa Juvêncio Cardoso. Eles utilizam a pimenta como agente bactericida para evitar a contaminação de alimentos que não são cozidos, como proteção contra maus espíritos e também em rituais de passagem para a vida adulta. As mulheres são as responsáveis pelo cultivo das roças e plantio das culturas, dentre elas as pimentas. A pimenta baniwa é produzida organicamente, e o mais interessante é que eles têm um blog e um site onde a pimenta pode ser adquirida! Essa pimenta tipo jiquitaia (que em tupi-guarani significa "sal com pimenta") é de alta picância e consiste de um "blend" de diversos tipos de pimentas (em geral, da espécie Capsicum frutescens, similar à pimenta tabasco) que os próprios baniwa cultivam - no caso, as mulheres da tribo. Cada mulher baniwa tem o seu próprio "jeito" de preparar a jiquitaia, tradição essa passada de geração em geração, mas o processo tem algumas etapas comuns. As pimentas são colhidas, desidratadas ao sol, moídas em pilão, e ao final recebem um pouco de sal. O sabor é bem forte e combina perfeitamente com diversas preparações culinárias, e na minha opinião até com pipoca fica gostoso!! Já experimentei jiquitaia quando cursei a disciplina de Gastronomia Molecular do curso de Ciências dos Alimentos, durante aula ministrada pelo professor Paulo Chanel D. Freitas, e adorei! Ainda não experimentei a pimenta baniwa, mas confesso que estou curiosíssima para provar!



Imagem retirada de: http://ecoredesocial.com.br

  Essa pimenta chegou ao mercado como o primeiro tempero brasileiro com selo de origem controlada. Como podemos ver, a jiquitaia tem uma importância muito grande para a cultura alimentar brasileira, pois está se popularizando no país e já é utilizada por chefs de cozinha de renomados restaurantes. Além disso, consiste em um símbolo da cultura indígena brasileira que merece ser valorizada, respeitada e difundida. 


  As pimentas são muito utilizadas na culinária brasileira, principalmente na região Nordeste. Se você viajar para lá e for comer um acarajé, não peça um acarajé quente - a não ser que você queira por suas papilas gustativas à prova e experimentar essa delícia com uma quantidade considerável de pimenta. "Comida quente" também é um sinônimo para comida apimentada, por conta da pungência e do "calor" que sentimos quando comemos pimenta. Carnes, molhos, temperos, peixes, ensopados, e até doces: diversas preparações podem levar um ou mais tipos de pimentas. Há quem consuma até mesmo geleia de pimenta! E se você gosta de pimentas e ainda não experimentou essa geleia, sugiro fortemente que o faça, pois é uma delícia - ainda mais se for acompanhada por torradas e queijos de sabores mais neutros. O chocolate com pimenta também é uma combinação e tanto, e é uma delícia sentir os contrastes do gosto doce do chocolate com o sabor pungente da pimenta. Os chillis ainda podem compor caldas de chocolate e de frutas vermelhas, sorvetes e até brigadeiros, além de diversos outros pratos que sua criatividade sugerir! 



  Além de terem grande importância na cultura alimentar brasileira, as pimentas também estão presentes na culinária de praticamente todos os outros países do mundo, como México, Portugal, Angola, Espanha, entre outros. Bem, a origem exata das pimentas é meio difícil de ser determinada e é discutível, mas acredita-se que as pimentas do gênero Capsicum começaram a ser cultivadas e exploradas há mais ou menos 12.000 anos, ainda no início do povoamento humano no continente americano. As pimentas eram utilizadas tanto para fins alimentícios como para medicinais, que pode inclusive ter precedido o uso alimentício. Aqui no Brasil, como  comentei, os indígenas já cultivavam pimentas tanto para utilizarem como tempero quanto para fins medicinais e em rituais religiosos (para proteger o corpo contra maus espíritos, por exemplo).  

  As pimentas possuem antioxidantes naturais, como as vitaminas C e E, carotenoides, compostos fenólicos (que possuem atividade antioxidante, protegendo o organismo contra a ação de radicais livres), e vitamina K, que possui papel relevante na coagulação sanguínea. A capsaicina pode fazer parte de cremes, sprays, géis e estar presente em combinações com analgésicos e anestésicos. Esse princípio ativo também aparenta agir contra dores musculares e das articulações, podendo auxiliar também no tratamento da psoríase ao contribuir na redução de eritemas e coceiras. Mas para pessoas que possuem gastrite, úlcera, hipertensão ou alguns distúrbios gastrointestinais, é recomendável que não consumam pimenta para evitar o agravamento de sintomas desconfortáveis.

O "termômetro" das pimentas!   


  Só as pimentas vermelhas é que ardem, certo?

  Errado! Vários tipos de pimentas, vermelhas ou não, têm essa picância característica. 

  Isso se deve às substâncias ativas piperina (presente nas pimentas do gênero Piper) e capsaicina (presente nas pimentas do gênero Capsicum). Essas substâncias químicas possuem estruturas diferentes e podem tanto estimular os receptores da pele ou das mucosa bucal, quanto atuar de maneira direta irritando a área de contato e provocando vasodilatação. Isto é o que provoca aquela ardência quando consumimos ou manipulamos pimenta, que pode variar conforme a quantidade consumida, o tipo de pimenta, à sensibilidade de cada pessoa, e a matriz que está sendo consumida - aquosa ou lipídica. Isto é: pelo fato dessas duas substâncias químicas serem majoritariamente apolares (não se dissolverem bem em água), elas são mais solúveis em óleo e alimentos com teor de gordura maior. Conservas de pimentas que utilizam óleo justamente promovem a potencialização dessa picância: a piperina ou a capsaicina da pimenta passa toda para o óleo, e ele causará ardência quando consumido. Por isso que algumas poucas gotinhas do óleo da pimenta em conserva já bastam para dar aquele punch de sabor e ardência que muitos adoram.

  E quando estamos sentindo essa queimação na boca, corremos logo atrás de um copo de água para amenizar a ardência. Mas sabia que isso não adianta? Quando você come muita pimenta, ou quando ela é muito ardida, é melhor você comer um pedaço de pão ou tomar leite do que beber água. Quando você bebe água a ardência não passa porque a capsaicina e a piperina são insolúveis em água. Se você toma um pouco de leite, por este ser um alimento que tem gordura, esses princípios ativos se "dissolvem" no leite, o que favorece o sumiço daquela sensação de queimação na boca. 

  Falando nisso, você sabia que foi desenvolvida uma escala de mensuração da pungência de pimentas? Veja abaixo uma parte dessa escala:



Escala de ardência de pimentas . Imagem retirada de: http://confrariadapimenta.com


  A escala Scoville foi desenvolvida em 1912 pelo farmacologista americano Wilbur Scoville, que elaborou um teste organoléptico para determinar a pungência/ardor de diferentes tipos de pimenta do gênero Capsicum. As pessoas que participaram desse teste (que coragem, hein?) tiveram que experimentar um tipo de solução, obtida pela dissolução de um "extrato" de pimenta (produzido pela pesagem de uma determinada massa da pimenta e sua dissolução em álcool) diluído em uma mistura de água e açúcar. Quanto maior fosse a necessidade de diluir essa solução até que o provador não sentisse mais a picância - ou seja, quanto maior a necessidade de aumentar a proporção da mistura de água e açúcar - mais ardida era a pimenta. Logo, quanto maior o número de unidades Scoville, mais ardida é a pimenta.

  E lembrando: se você não quer sentir todo o ardor que uma pimenta pode lhe oferecer, é só cortá-la ao meio e retirar a placenta da pimeta, aquela parte branca onde ficam as sementes. É ali que ficam concentradas a capsaicina e a piperina, então para aliviar a pungência característica, você pode remover essa parte.


Tipos de pimenta


  Com base na escala de Scoville, vamos conhecer alguns tipos de pimentas? 


Biquinho


Imagem retirada de: http://brasilianfood.blogspot.com.br

  É conhecida como a pimenta que não arde. O que vem bem ao encontro da escala de Scoville, na qual está classificada com 500 unidades. Além disso, ela tem uma certa "doçura", e combina muito bem com carnes e preparações agridoces. É muito apreciada pelos brasileiros justamente por não ser ardida, mas se você gosta de sabores mais fortes, existem diversas opções para você. Continue lendo o post!

Bode (Capsicum chinense)


Pimenta bode. Imagem retirada de: http://imguol.com


  Com um nome mais diferentão e uma aparência inofensiva, essa pimenta é mais ardida, o que justifica bem as 30.000 unidades Scoville que a escala nos mostra. Eu já experimentei e senti a ardência logo de cara. Ela está acima de pimentas como dedo-de-moça e tabasco, segundo a escala que apresentamos. É muito consumida no estado de Goiás, sendo utilizada no preparo de carnes, feijão e arroz. Também pode ser utilizada em conservas. 


Cumari-verdadeira (Capsicum baccatum)


  
Imagem retirada de:http://come-se.blogspot.com.br
     A pimenta cumari verdadeira, ou comari verdadeira, é assim chamada pois sua aparência se assemelha à cumari-do-pará, mas essas pimentas apresentam características sensoriais diferentes quando consumidas. A cumari verdadeira possui formato pequeno e ovalado, e também é muito utilizada em molhos, temperos e conservas. Tem um sabor bastante diferente da pimenta dedo-de-moça, que costumamos consumir mais no Brasil, e uma pungência bem maior.


Bhut jolokia (Capsicum chinense)

   Pensa em uma pimenta muito ardida... pensou? Ela não chega nem perto da Bhut jolokia!! Se eu fosse você, não me arriscaria a experimentar essa pimenta, e falo isso por experiência própria. Mas se você tiver MUITA CORAGEM, não deixe de tomar alguns cuidados durante sua manipulação - por exemplo, utilizar proteção nos olhos e luvas. Como comentei, na disciplina de Gastronomia Molecular do curso de Ciências dos Alimentos, tivemos uma aula teórica sobre pimentas e uma prática para analisarmos as diferenças de vários tipos de pimentas. A Bhut jolokia estava lá, e eu, como boa Cientista de Alimentos, me arrisquei a experimentar uma quantidade mínima, pois já havíamos sido alertados pelo professor que essa é uma das pimentas mais ardidas do mundo. Coloquei algumas gotinhas em uma torrada, e logo que comi, senti o ardor FORTÍSSIMO dessa pimenta. Para vocês terem uma noção, NENHUM alimento ou pimenta que eu experimentei até hoje se comparam a ela! É muito ardida mesmo, a boca queima, os olhos lacrimejam, fica difícil até mesmo de respirar, e nada parece eliminar ou mitigar a pungência. Pelo menos essa foi a minha sensação. Essa pimenta, que tem "só " 855.000 unidades Scoville (!!!), é originária da Índia, e liderou o ranking como a pimenta mais ardida do mundo até 2011. É meio impossível acreditar, mas existe uma mais forte que ela!!



Imagem retirada de:http://confrariadapimenta.com




Prontos para conhecer a pimenta mais ardida do mundo?? 😲



Com vocês...


Carolina reaper (Capsicum chinense)

  Com nada menos de 1.650.000 unidades Scoville, essa pimenta só fica atrás do spray de pimenta (5.000.000 de unidades Scoville) e da capsaicina pura (16.000.000 de unidades Scoville). Ela se mantém como a pimenta mais forte do mundo desde 2013. Acredito que seja praticamente intragável devido à sua pungência estratosférica, e sinceramente não tenho a mínima curiosidade em conhecer o sabor dessa pimenta. É muito importante dizer que a HP22BNH - como também é chamada - se for usada, deve ser manipulada com MUITA cautela e proteção, e ser utilizada com responsabilidade e em poucas quantidades, pois pode provocar reações muito graves quando consumidas ou manipuladas - até mesmo asfixia. A pungência é tão intensa que eu coloquei a foto de somente uma Carolina reaper.


Imagem retirada de:https://www.crazyhotseeds.com






Bem, pessoal, espero que tenham gostado desse post quente! E, claro, não se esqueçam de clicar em "Seguir" aqui no blog, de compartilhar esse post com seus amigos e de nos seguir nas nossas redes sociais, Facebook e Instagram !



Gratidão!


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Referências consultadas:

Confraria da Pimenta: http://confrariadapimenta.com

EMBRAPA. Pimenta (Capsicum spp). 2007. Disponível em:<https://sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br/FontesHTML/Pimenta/Pimenta_capsicuEm_spp/botanica.html>. Acesso em 05 nov. 2016.

GLOBO RURAL. Índios são mestres no cultivo de dezenas de variedades de pimentas. Disponível em:<http://g1.globo.com/economia/agronegocios/noticia/2013/10/indios-sao-mestres-no-cultivo-de-dezenas-de-variedades-de-pimenta.html>. Acesso em 13 nov. 2016.


Pimentas online: http://www.pimentasonline.com

ROMAN, A.L.C.; MING, L.C.; CARVALHO, I.; SABLAYROLLES, M.G.P. Uso medicinal da pimenta malagueta (Capsicum frutescens L.) em uma comunidade de várzea à margem do rio Amazonas. 2011. Disponível em:<http://www.scielo.br/pdf/bgoeldi/v6n3/05.pdf>. Acesso em 15 nov. 2016.

SERVA, L. Pimenta dos índios baniuas chega ao mercado com selo de origem. 2014. Disponível em:<http://www1.folha.uol.com.br/comida/2014/05/1453658-pimenta-dos-indios-baniuas-chega-ao-mercado-com-selo-de-origem.shtml>. Acesso em 12 nov. 2016.

ZANCANARO, R.D. PIMENTAS: TIPOS, UTILIZAÇÃO NA CULINÁRIA E FUNÇÕES NO ORGANISMO. 2008. Disponível em: <http://www.bdm.unb.br/bitstream/10483/361/1/2008_RaquelDaneliczenZancanaro.pdf>. Acesso em 10 nov. 2016.

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